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Sororidade

      Se acaso me fosse concedido o poder de dar inicio a algo mágico, capaz de “re-rumar” construtivamente nossa sociedade, vem-me a mente Kate Milled e a sororidade.

      De “soror” (irmã), o termo ultrapassa a noção de uma fraternidade particular para convidar as mulheres a um feminismo contemporâneo, no qual seja possível, a um só tempo, estar atualizada aos novos tempos e resgatar o passado mágico onde éramos detentoras do conhecimento ancestral.

     A prática da sororidade traz em si o valor do coletivo, calcado na intenção de mudar. É tratar o “jeitinho feminino” numa dimensão construtiva em favor das mulheres. É o convite para o exercício da empatia.

Portanto o velho jargão marxista por ser reescrito sob a forma de “mulheres de todo o mundo uni-vos, nada tende a perder senão as correntes”

       Na verdade, só temos a ganhar. Penso que o primeiro passo é mudar a forma como as mulheres se olham entre si, tomando consciência de que uma das táticas da estrutura de poder reside na fragmentação de grupos. No caso somos o maior grupo da humanidade. Reconhecer-nos como tal é ponto de partida.

    Não se trata de uma jornada fácil e é importante estar atento para a experiência histórica em que o poder feminino foi demonizado, transformando o conhecimento ancestral que as mulheres detinham numa ideia de instrumento do mal.

     No mundo contemporâneo outros mecanismos estarão disponíveis para não permitir que a sororidade se enrede no seio feminino e dê andamento a uma reconstrução a partir do exercício da empatia. É preciso estarmos atentas para reconhecer as ciladas do divisionismo que estarão sempre prontas a nos dividir.

Para tanto, não basta apenas sermos amigas, porque o conceito de sororidade vai muito além, trazendo em si a ideia de que podemos amar sem necessariamente gostar, numa perspectiva em que amar é respeitar o outro na sua inteireza e diferença. Portanto, necessitamos nos amar.

     Ao nos dedicarmos a amar todas as mulheres damos início a um exercício coletivo de fraternidade, pondo em curso uma mentalidade de transformação do mundo para além de tão somente levantar uma bandeira.

      Somos bem mais do que uma flâmula. Somos uma nação!

    Faz-se importante não só deixar de lado as diferenças, mas efetivamente disponibilizar nossos egos a, reconhecendo-as, aprender a respeita-las.

     No dia a dia sugiro alguns exercícios de empatia.

   Observo que a sexualidade feminina é um dos fortes recursos de divisão. Somos putas, doutoras, descoladas, independentes, senhoras. Cada uma dessas categorias ocupa um espaço de (des)respeitabilidade.

    Podemos começar pela desconstrução dessa categoria com uma bandeira: a vagina é minha, ou a xoxota é minha, ou a periquita é minha ou qualquer um dos nomes que queiramos dar a nossa genitália.

    É se é de cada uma, num ato de libertação compartilhada ajustamos não aceitar a categorização em razão de comportamento sexual.

    Temos a categorização pela condição social e aí estarão a mulher doméstica e a intelectualizada, classificação que traz em si um festival de outras, como a mulher negra e a branca, a pobre e a rica. Nesse ponto o convite ao desmonte está em recusar as críticas ou justificativas que tenham essa condição como fundamento.

    Mais do que rejeitar as inúmeras classificações discriminatórias, é preciso olhar para dentro de nós mesmas, em busca da própria história, e, localizando em nosso íntimo a semente histórica da discriminação, nos disponibilizarmos a rever os padrões, estejam eles gritando ou latentes em nossos corações e mentes.

   A grande vantagem de investir na empatia feminina é que ela vem embalada na doçura, na segurança, na altivez, na maternidade ainda que não fisicamente executada, na essência da condição feminina.

   Ao ponto de realizarmos a máxima de Mme. Beauvoir: “Que nada nos limite, que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja nossa própria substância, já que viver é ser livre”

 

 

 

Paula Frassinetti Mattos

                           Mulher e Advogada

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